quarta-feira, 20 de abril de 2011

Fique ligado, vampiros existem.

Eu não acredito em gnomos ou duendes, mas vampiros existem. Fique ligado, eles podem estar numa sala de bate-papo virtual, no balcão de um bar, no estacionamento de um shopping. Vampiros e vampiras aproximam-se com uma conversa fiada, pedem seu telefone, ligam no outro dia, convidam para um cinema. Quando você menos espera, está entregando a eles seu rico pescocinho e mais. Este "mais" você vai acabar descobrindo o que é com o tempo.

Vampiros tratam você muito bem, têm muita cultura, presença de espírito e conhecimento da vida. Você fica certo que conheceu uma pessoa especial. Custa a se dar conta de que eles são vampiros, parecem gente. Até que começam a sugar você. Sugam todinho o seu amor, sugam sua confiança, sugam sua tolerância, sugam sua fé, sugam seu tempo, sugam suas ilusões. Vampiros deixam você murchinha, chupam até a última gota. Um belo dia você descobre que nunca recebeu nada em troca, que amou pelos dois, que foi sempre um ombro amigo, que sempre esteve à disposição, e sofreu tão solitariamente que hoje se encontra aí, mais carniça do que carne.

Esta é uma historinha de terror que se repete ano após ano, por séculos. Relações vampirescas: o morcegão surge com uma carinha de fome e cansaço, como se não tivesse dormido a noite toda, e você se oferece para uma conversa, um abraço, uma força. Aí ele se revitaliza e bate as asinhas. Acontece em São Paulo, Manaus, Recife, Florianópolis, em todo lugar, não só na Transilvânia. E ocorre também entre amigos, entre colegas de trabalho, entre familiares, não só nas relações de amor.

Doe sangue para hospitais. Dê seu sangue por um projeto de vida, por um sonho. Mas não doe para aqueles que sempre, sempre, sempre vão lhe pedir mais e lhe retribuir jamais.


Martha Medeiros, sempre um aprendizado.

quinta-feira, 24 de março de 2011

"Falar"

Já fui de esconder o que sentia, e sofri com isso.

Hoje não escondo nada do que sinto e penso, e às vezes também sofro com isso, mas ao menos não compactuo mais com um tipo de silêncio nocivo: o silêncio que tortura o outro, que confunde, o silêncio a fim de manter o poder num relacionamento.

Assisti ao filme "Mentiras sinceras" com uma pontinha de decepção - os comentários haviam sido ótimos, porém a contenção inglesa do filme me irritou um pouco - mas, nos momentos finais, uma cena aparentemente simples redimiu minha frustração.

Embaixo de um guarda-chuva, numa noite fria e molhada, um homem diz para uma mulher o que ela sempre precisou ouvir. E eu pensei: "como é fácil libertar uma pessoa de seus fantasmas e, libertando-a, abrir uma possibilidade de tê-la de volta, mais inteira. "

Falar o que se sente é considerado uma fraqueza. Ao sermos absolutamente sinceros, a vulnerabilidade se instala. Perde-se o mistério que nos veste tão bem, ficamos nus.

E não é este tipo de nudez que nos atrai. Se a verdade pode parecer perturbadora para quem fala, é extremamente libertadora para quem ouve. É como se uma mão gigantesca varresse num segundo todas as nossas dúvidas. Finalmente se sabe.

Mas sabe-se o quê? O que todos nós, no fundo, queremos saber: se somos amados. Tão banal, não?

E no entanto esta banalidade é fomentadora das maiores carências, de traumas que nos aleijam, nos paralisam e nos afastam das pessoas que nos são mais caras.

Por que a dificuldade de dizer para alguém o quanto ele é - ou foi - importante? Dizer não como recurso de sedução, mas como um ato de generosidade, dizer sem esperar nada em troca. Dizer, simplesmente.

A maioria das relações - entre amantes, entre pais e filhos, e mesmo entre amigos - ampara-se em mentiras parciais e verdades pela metade.

Pode-se passar anos ao lado de alguém falando coisas inteligentíssimas, citando poemas, esbanjando presença de espírito, sem alcançar a delicadeza de uma declaração genuína e libertadora: dar ao outro uma certeza e, com a certeza, a liberdade.

Parece que só conseguiremos manter as pessoas ao nosso lado se elas não souberem tudo. Ou, ao menos, se não souberem o essencial.

E assim, através da manipulação, a relação passa a ficar doentia, inquieta, frágil. Em vez de uma vida a dois, passa-se a ter uma sobrevida a dois.

Deixar o outro inseguro é uma maneira de prendê-lo a nós - e este "a nós" inspira um providencial duplo sentido. Mesmo que ele tente se libertar, estará amarrado aos pontos de interrogação que colecionou.

Somos sádicos e avaros ao economizar nossos "eu te perdôo", "eu te compreendo", "eu te aceito como és" e o nosso mais profundo "eu te amo" - não o "eu te amo" dito às pressas no final de uma ligação telefônica, por força do hábito, e sim o "eu te amo" que significa: "seja feliz da maneira que você escolher, meu sentimento permanecerá o mesmo".

Libertar uma pessoa pode levar menos de um minuto. Oprimi-la é trabalho para uma vida. Mais que as mentiras, o silêncio é que é a verdadeira arma letal das relações humanas.


* Martha Medeiros, minha inspiração.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Memórias alheias

Descobri que minha obsessão por cada coisa em seu lugar, cada assunto em seu tempo, cada palavra em seu estilo, não era o prêmio merecido de uma mente em ordem, mas, pelo contrário, todo um sistema de simulação inventado por mim para ocultar a desordem de minha natureza. Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma e sim um signo do Zodíaco.


(Memórias de Minhas Putas Tristes - Pg. 74)

Gabriel García Marques.



segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Só os loucos sabem

Era fim de tarde. A correspondência devia ser aberta. Um cartão colorido chamava a atenção entre os envelopes brancos e amarelados espalhados pela mesa. Para não contrariar as leis da psicologia e as estáticas comprovadas, o primeiro a ser lido foi o tal chamativo cartão. Era abstrato, alguns riscos que pareciam formar uma rosa vermelha se misturavam em todas as direções com o marrom e bege do desenho que supostamente, retratava o pé de um homem. Dentro, uma mensagem: "Perdão é o perfume que a rosa deixa no calcanhar de quem a esmaga." autor da mensagem e do desenho? doente mental do hospital da cidade.

Naqueles momentos de raiva, de feridas abertas, de decepção, naqueles momentos difíceis de descer pela garganta e tão fáceis de serem avaliados, nestes momentos que fazem-nos pensar que os dias são menos gloriosos do que na verdade sempre foram, são e serão, nestas horas que você percebe que a remediação para todas as feridas abertas não dependia de você.Nestas desgastantes, porém, enriquecedoras horas que a vida te prova que ninguém deve esperar quer seja o reconhecimento, a consideração ou até o respeito, mesmo daqueles seres julgados tão merecedores da maior honra da vida: que é ter alguém que despido de toda intenção secundária, se importe e acredite em você. São nestas doloridas horas que aprendemos que nem sempre recebemos o que ofertamos.

Pois é assim, em meio a toda fúria e efusão dos mais desiludidos pensamentos sobre o ser humano, lá vem ele, sinalizando a paz, e fazendo o prenúncio de um novo recomeço : o perdão. Cabisbaixo e cheio de pressa, o perdão começa seus questionamentos. Às vezes nos faz indagar se vale a pena anular todos os bons momentos por uma falta despretensiosa e infeliz. Outras, se dizem por si mesmos e juram de pé de junto que nunca mais vai acontecer. Há ainda quando torturam a si próprios no intuito de nos provarem que verdadeiramente se arrependeram ou quando ressaltam a sua agonia para demostrarem que se importam. Sem contar as vezes que não questionam, não indagam, afirmam.E sempre em suas assertativas terminam dizendo: afinal somos humanos. Mas existe também aquele que conhece muito bem seus direitos divinamente concedidos e logo recorre à tão famosa citação cristã: "...pois então, que atire a primeira pedra..." E então, quando todos os argumentos se vão, o mesmo perdão outrora triste e envergonhado , perde a razão e se transforma na arrogância incutida na popular frase: Fiz o que pude, ninguém é perfeito. Que se dane!

Empate. O ferido e o causador da ferida sentem-se igualmente ludibriados. O primeiro porque já não é a primeira, mas talvez a segunda ou terceira vez que foi desiludido e teve suas mais certas convicções dilaceradas e registradas nas páginas do livro mais precioso que cada ser carrega consigo: a sua própria vida. O segundo, porque embora regado do mais honesto arrependimento, ainda que não tenha como prová-lo, é ignorado. A verdade? Ambos cometem equívocos em suas justificativas.

O ferido erra quando afirma que quem errou foi o outro.Porque não foi. Quem errou foi ele mesmo, sua culpa reside no fato de ter atribuído demasiado valor e estima à alguém que não é merecedor de tal fortuna, e muito menos capaz de sustentar a coerência entre suas palavras e ações, alguém que se diz irmão e nunca ofereceu ajuda , alguém que se diz amigo para todas horas e virou as costas quando mais se precisou, alguém que se diz amor eterno, mas só o é enquanto é conveniente e fácil manter. Se fosse fácil cultivar família, amigos e amores, aqueles que o conseguem não se distinguiriam entre os demais.

O causador da ferida erra porque não entende que perdão não é obrigação, nem muito menos deve ser confundido com tolerância e permissão para o erro. Perdão exige tempo. Exige esforço.

No fim, por mais que se perdoe ou que se seja perdoado, as cicatrizes ficam, algumas mais finas e discretas do que outras, mas ficam como lembretes em nossa memória de que não importa quão justo ou bom você seja, um dia você vai ser ferido assim como também, vai ferir.

Fechei o cartão e observei novamente o desenho da rosa e do pé. Pensei que por pior que seja a dor de uma mágoa, por maior que seja o tamanho da ferida, ainda assim, nada é tão pior e angustiante do que o perdão que nós devemos a nós mesmos.Perdoar a si mesmo é muito mais difícil e complexo do que ser perdoado ou perdoar outro alguém. Como se faz para perdoar quando é você que traiu, mentiu ou virou as costas, ou quando é você que faltou com a palavra?
O que acontece se ao mesmo tempo você é a rosa e o calcanhar que a esmaga?

Recomendo uma visita à um certo pintor e escritor de um chamativo cartão;
porque disto, só os loucos sabem.















Tainá Lima













terça-feira, 6 de julho de 2010

It seems like a disaster, but it isn't...

The art of losing isn't hard to master;
so many things seem filled with the intent
to be lost that their loss is no disaster.

Lose something every day. Accept the fluster
of lost door keys, the hour badly spent.
The art of losing isn't hard to master.

Then practice losing farther, losing faster:
places, and names, and where it was you meant
to travel. None of these will bring disaster.

I lost my mother's watch. And look! my last, or
next-to-last, of three loved houses went.
The art of losing isn't hard to master.

I lost two cities, lovely ones. And, vaster,
some realms I owned, two rivers, a continent.
I missed them, but it wasn't a disaster.

- Even losing you (the joking voice, a gesture
I love) I shan't have lied. It's evident
the art of losing's not too hard to master
though it may look like (write it!) like disaster.


from the book "In her shoes"
the best one dollar spent in my whole life.

domingo, 27 de junho de 2010

My wish

Eu desejo que desejes ser feliz de um modo possível e rápido,
desejo que desejes uma via expressa rumo a realizações não utópicas,
mas viáveis, que desejes coisas simples como um suco gelado
depois de correr ou um abraço ao chegar em casa,
desejo que desejes com discernimento e com alvos bem mirados.

Mas desejo também que desejes com audácia,
que desejes uns sonhos descabidos
e que ao sabê-los impossíveis não os leve em grande consideração,
mas os mantenha acesos, livres de frustração,
desejes com fantasia e atrevimento,
estando alerta para as casualidades e os milagres,
para o imponderável da vida, onde os desejos secretos são atendidos.

Desejo que desejes trabalhar melhor, que desejes amar com menos amarras,
que desejes parar de fumar, que desejes viajar para bem longe
e desejes voltar para teu canto, desejo que desejes crescer
e que desejes o choro e o silêncio, através deles somos puxados pra dentro,
eu desejo que desejes ter a coragem de se enxergar mais nitidamente.

Mas desejo também que desejes uma alegria incontida,
que desejes mais amigos, e nem precisam ser melhores amigos,
basta que sejam bons parceiros de esporte e de mesas de bar,
que desejes o bar tanto quanto a igreja,
mas que o desejo pelo encontro seja sincero,
que desejes escutar as histórias dos outros,
que desejes acreditar nelas e desacreditar também,
faz parte este ir-e-vir de certezas e incertezas,
que desejes não ter tantos desejos concretos,
que o desejo maior seja a convivência pacífica
com outros que desejam outras coisas.

Desejo que desejes alguma mudança,
uma mudança que seja necessária e que ela não te pese na alma,
mudanças são temidas, mas não há outro combustível para essa travessia.
Desejo que desejes um ano inteiro de muitos meses bem fechados,
que nada fique por fazer, e desejo, principalmente,
que desejes desejar, que te permitas desejar,
pois o desejo é vigoroso e gratuito, o desejo é inocente,
não reprima teus pedidos ocultos, desejo que desejes vitórias,
romances, diagnósticos favoráveis, mais dinheiro e sentimentos vários,
mas desejo, antes de tudo, que desejes, simplesmente.

Martha Medeiros

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

just breathe

Exigir sempre mais de si;
eis o degrau primordial na busca daquilo que gostaríamos ser.
O melhor;
ou nada.

Dias radicais que mudam o rumo desse fluxo de ir e vir que chamamos de vida.

Think about